Os melhores e os piores filmes de terror de 2023: o que eles têm em comum

Terror é o gênero que mais tenho tolerância para consumir. Ou seja, assisto a muita coisa boa e muita coisa ruim. Às vezes, sei que algo é ruim, mas assisto mesmo assim. O fato é que ao consumir muita coisa do mesmo gênero vamos ampliando nossa visão e percebendo muitas coisas em comuns entre as obras. Essa noção é o que nos permite diferenciar o que é bom ou ruim e saber quando estão fazendo mais do mesmo.

Os melhores…

Dentre os filmes de terror que eu assisti em 2023 dois se destacaram e são os que eu considero os melhores do gênero desse ano. Mas algo muito especial fez com o que eles se diferenciassem dos demais.

Danny e Michael Philippou é uma dupla australiana de irmãos que começaram no YouTube fazendo vídeos de comédia. Porém, a produtora A24 se interessou por um de seus roteiros de um projeto de terror e após um acordo em agosto de 2023 foi lançado “Fale Comigo”.

Na trama, jovens gravam vídeos e se divertem com um jogo de possessão através de uma mão embalsamada e Mia, a protagonista, vê isso como uma chance de falar com a sua falecida mãe. Na primeira vista não tem nada de novo por aqui, na verdade é bem simples e comum os elementos que são trabalhados no filme: um objeto amaldiçoado, regras que se deve cumprir e que eventualmente vão ser quebradas, jovens burros e possessão.

A grande questão aqui está atrelada aos seus realizadores, já que os irmãos Philippou usam sua experiência no YouTube para falar sobre mídias sociais e a banalização dos jovens a assuntos mais sérios, já que se aproveitam de tudo para filmar e conseguir likes. Não à toa, a possessão nesse filme é vista como entretenimento e não como uma ameaça logo de cara.

Em novembro, na Argentina, era lançado “Cuando acecha la maldad”, (“O Mal que nos Habita”, como ficará conhecido aqui no Brasil). Este filme tem um realizador mais experiente, Demián Rugna. E aqui temos um cenário peculiar. A Argentina enfrentou uma espécie de pandemia de possessão demoníaca, frente a essa situação existe alguns agentes do governo que cuidam dessa situação, matando o possuído de uma forma que a possessão não se espalhe. Porém, isso aconteceu anos antes do filme começar e a trama acompanha uma cidade no interior que tem uma pessoa possuída esquecida pelo governo.

Rugna mostra sua habilidade de roteirista em criar e estabelecer muito rapidamente todo um cenário próprio, nos fazendo entender onde estamos logo de cara. Isso é importante pois quando finalmente as coisas saem do controle sentimos o peso de cada ação e consequência.

Junto a isso temos o estilo de horror brutal de Rugna, do tipo que não sente pena de seus personagens. A direção passa rápido pelas cenas e depois foca durante um longo tempo, nos fazendo pensar primeiro se foi aquilo mesmo que vimos e logo pós nos mostrando que sim, foi isso mesmo que aconteceu.

Comparando as duas obras, fica bem óbvio o que aconteceu aqui de diferente, as duas são extremamente originais. Nenhuma delas cria um novo gênero de terror ou um novo jeito de assustar as pessoas, elas simplesmente pegam elementos que conhecemos e trabalha de forma diferente.

Afinal de contas era muito fácil para Demián Rugna fazer um filme de exorcismo com uma criança possuída, um padre que explica todo o roteiro e  cenas de contorcionismo e vozes guturais. Ao invés disso, a possessão demoníaca é uma realidade palpável e crua. A situação piora não por burrice de personagens, mas por negligência do governo que devia lidar com a situação e os personagens cada vez perdem sua humanidade fazendo um paralelo com a ideia de possessão de um forma mais realista. Enquanto isso, Danny e Michael Philippou optam por um lado de espetacularização, como cada vez mais tudo fica banal por conta das mídias sociais.

Afinal de contas, quando buscamos coisas novas, não necessariamente é algo que nunca provamos, algo totalmente novo tende a não ser bem recebido pelo público. Aqui temos dois exemplos que trabalham com originalidade os clichês do gênero e elementos considerados batidos, podendo assim dar uma sobrevida a esses elementos que tanto gostamos.

Os piores…

Algo curioso que é que pessoas amam terror. Porém, nem todas gostam do mesmo estilo, tanto que o gênero é dividido em diferentes subgêneros e novos são criados com o passar dos anos. O lado ruim disso é a quantidade massiva de produções que visam apenas o lucro e acabam sendo realizadas de uma forma mais fácil.

É bem mais fácil desenvolver elementos em comuns de filmes ruins. A maioria deles seguem a mesma fórmula e, por conta de um desenvolvimento vazio, os clichês são as únicas coisas onde as produções se apoiam. Então mortes aleatórias, sustos baratos, sons altos são clichês que chegam a me tirar do sério. Mas, os dois filmes que eu quero abordar aqui conseguiram ir além disso e procuraram se apoiar em algo ainda mais preguiçoso.

Fora do eixo que é considerado cult hoje em dia, James Wan é um diretor que consegue entregar obras de qualidade ainda que sejam facilmente comerciais.  Como uma espécie de Midas do terror, ele é responsável por criar algumas das principais franquias do terror, dirigindo apenas o primeiro filme e assinando suas continuações como produtor. Algumas das principais são, Jogos Mortais, Sobrenatural e, onde eu quero chegar aqui, “Invocação do Mal”.

A franquia “Invocação do Mal” rendeu alguns derivados e, em 2023, foi lançado “A freira 2”. Dirigido por Michael Chaves, a obra cumpre todos os requisitos que eu listei anteriormente. Ambientado em 1956, na França, o demônio Valak retorna após o embate do primeiro filme o que obriga a irmã Irene, ir atrás de uma nova relíquia para deter a entidade maligna.

Deixando de lado o fato de ser exatamente a mesma história do filme anterior, o filme parece que roda o tempo todo com um alarme prestes a tocar, informando que após determinado tempo é necessário ter uma morte ou uma cena de susto aleatório, nos quais colocam em risco personagens que nem sabemos o nome.

Esse tipo de fórmula preguiçosa foi aproveitada aos montes pelo direto David Gordon Green em “O Exorcista: o Devoto”. Além de não entender o ponto principal do filme original, essa sequência tem vergonha de usar o termo exorcismo, o que resulta numa salada mista em busca de agradar todas as religiões e todos os públicos.

Quando a trama acompanha duas garotinhas que ficam desaparecidas por três dias e, ao serem encontradas, estão acompanhadas de um ser maligno, você até pode achar que a trama vai dar a devida atenção ao drama familiar, a uma possível trama de redenção explorando relações de pai e filha. Mas a realidade é muito mais vazia do que isso, se resumindo a basicamente frases de autoajuda com uma resolução tão estúpida quanto medíocre.

Entre as duas produções, é notável uma falsa sensação de seguir um legado, podemos chamar assim ou podemos chamar de “se aproveitar de algo que não é seu”. Nelas temos um elemento validador para justificar a produção, se substituir o demônio Valak, “A Freira 2” poderia ser qualquer outro filme genérico de assombração, assim como se retirarmos a participação da atriz Ellen Burstyn de “O Exorcista: O Devoto”, ele se torna apenas mais uma cópia de “O Exorcista” original.

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