Kaijin Nijūichi Mensō: o monstro das 21 faces

O Japão é conhecido por ser um país extremamente seguro e pacífico. Não são raros os relatos de pessoas afirmando que é tranquilo, inclusive, sair de madrugada para comprar algum lanche em um “konbini” (lojas de conveniência que são realmente convenientes). Convenhamos que algo desse tipo é impensável no Brasil e na maior parte da América Latina. Inclusive, aqui é comum de se pensar que ao sair tão tarde para comprar algo, boa coisa não deve ser.

Aliás, em questões de segurança pública, o Japão é tão diferente da maioria dos demais países do mundo que os locais mais “barra pesada” de lá seriam considerados quase banais por um latino-americano. Exemplo disso são os prostíbulos disfarçados de bares comuns, geralmente dominados pela máfia, na qual é possível levar um golpe e ter que pagar um valor muito maior pelo serviço. Na pior das hipóteses, a pessoa leva uma surra. Enquanto isso, em algumas regiões do Brasil, tiroteios são tão comuns que os moradores locais veem como algo quase normal.

Contudo, isso não significa que o Japão não tenha seus casos criminais pesados ou peculiares. E o que dizer quando um caso de polícia é tão grave que até mesmo afeta a economia? Para piorar, até hoje o crime não foi solucionado. Pois essa foi a situação que o Japão enfrentou nos anos 1980 com o caso do “Kaijin Nijūichi Mensō”, que traduzindo fica “Monstro das 21 Faces”.  

Tudo começou em 1984 e envolveu uma série de eventos incluindo sequestro, incêndios criminosos tentativas de envenenamento e extorsão.

Em março de 1984, Katsuhisa Ezaki, CEO da fabricante de doces Ezaki Glico, foi sequestrado por dois bandidos armados em Osaka. Os criminosos exigiram um resgate de 1 bilhão de ienes e 100 kg de barras de ouro. Contudo, ele conseguiu devido a um descuido dos sequestradores. Após o sequestro, a empresa Glico foi alvo de várias ameaças e tentativas de extorsão envolvendo o “Monstro de 21 Faces”. No dia 10 de abril, carros da Ezaki Glico foram incendiados no estacionamento da própria empresa. Isso fez com que a polícia intensificasse as investigações, pois deduziram que os crimes estavam interligados.

Exatamente um mês depois, no dia 10 de maio, uma carta assinada pelo Monstro das 21 Faces chegou à empresa. Na carta, se afirmava que alguns doces da Glico haviam sido misturados com cianeto, o que causou um pânico generalizado. Diante disso, a polícia decidiu retirar todos os produtos da empresa dos supermercados do Japão. Curiosamente, foram levantados um total de 21 itens adulterados. Neste primeiro momento, o resultado foi um déficit de milhões e uma mega demissão de centenas funcionários da Glico.

Depois de um tempo, as ameaças se estenderam a outras grandes empresas alimentícias, como Morinaga, Marudai Ham e House Foods. O modus operandi era o mesmo: ameaças de envenenamento de produtos e demandas por dinheiro.

“Queridos policiais, não mintam. Todo crime começa com uma mentira, como dizemos no Japão. Vocês não sabem disso? Parecem estar perdidos”, dizia uma das cartas.

A polícia tinha apenas de imagens de uma câmera de segurança em uma loja onde os itens foram encontrados. Um homem que não era funcionário colocava alguns doces da empresa nas prateleiras. Porém, como as imagens não possuíam tanta nitidez como as câmeras de vigilância de hoje, a investigação policial não avançou. Além disso, algumas informações estavam desencontradas. Sabia-se que apenas dois homens sequestraram Ezaki, mas o número de pessoas que incendiaram os carros no pátio da empresa era maior. Além disso, apenas uma pessoa foi vista mexendo nos doces da empresa. Dessa forma, se acredita que mais de uma pessoa estaria por detrás do Monstro de 21 Faces.

Em 1985, a polícia finalmente conseguiu um retrato falado com base nas imagens da câmera de segurança, mas não obtiveram nenhuma identificação. Os investigadores chegaram a Miyazaki Manubu, que era um ativista que expôs a Ezaki Glico por despejar lixo industrial nos rios de Osaka em 1975. Além disso, a polícia encontrou uma fita com a voz do homem e, no áudio, ele pronunciava palavras similares às do Monstro das 21 Faces. No entanto, era uma prova fraca e o homem tinha um álibi.

A investigação acabou após o suicídio do chefe de polícia Shoji Yamamoto em 1985, que estava sofrendo muita pressão popular para pegar os responsáveis. Então, o Monstro das 21 Faces escreveu sua última carta à polícia:

“Shoji Yamamoto morreu. Que atitude estúpida! Nós não temos amigos ou esconderijos secretos. O que a polícia vem fazendo nos últimos um ano e cinco meses?”, escreveu ele. “Não deixem criminosos como nós escaparem. Nós decidimos parar de atormentar as empresas de alimentos. Se alguém tentar chantageá-las, não seremos nós, mas alguém tentando nos copiar. Somos pessoas más. Isso significa que podemos fazer mais do que apenas perseguir essas empresas. É divertido levar a vida de um homem malvado.”

O caso foi oficialmente encerrado em 2000 e não se sabe a verdadeira identidade do Monstro das 21 Faces. Além disso, mesmo que fossem encontrados os responsáveis atualmente, pelas leis japonesas, eles não seriam julgados devido ao tempo passado. No fim, apesar do dano causado pelo caso, a única vítima fatal foi o chefe de polícia. Ninguém mais foi envenenado ou ferido, mas os danos econômicos foram significativos e o pânico generalizado causou diversos problemas de natureza econômica, pois diversas pessoas passaram a se recusar a comprar itens alimentícios de mercados.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *