No dia 10 de Março de 2010 era exibido pela primeira vez “A Serbian Film”. A exibição ocorreu no South by Southwest, festival de filmes, música e tecnologia que acontece em Austin, no Texas. Lá, ele foi bem recebido, rendendo elogios para maquiagem e as alegorias do roteiro. A partir daí, o filme passou por vários festivais como em Bruxelas, Bélgica, Cannes na França e Montreal no Canadá. Porém, no Reino Unido onde começou a sua popularidade de fato.
Prestes a ser exibido no London Film Festival, o longa recebeu duras críticas do jornal The Sun, que o chamou de vil, repugnante e doentio. Logo entrou em cena o BBFC (órgão que regulamenta a classificação de filmes no Reino Unido), que exigiu 49 cortes. Assim, ele foi retirado do festival. O filme teve minutos cortados em festivais seguintes, sendo cinco minutos na Alemanha e oito na Austrália. Já na Espanha e Noruega ele foi banido.
No Brasil, ele foi exibido sem nenhum corte no Fantaspoa, festival de cinema de Porto Alegre que reúne filmes de horror e fantasia, mas acabou sendo retirado do catálogo do Riofan, no Rio de Janeiro. Um ano depois, a produção foi liberada comercialmente no nosso país, com o título de “Terror Sem Limites”.
Vamos analisar o motivo de tanta polêmica.
Dirigido pelo sérvio Srdjan Spasojevic, o filme acompanha Miles, um ex-ator pornô com dificuldades financeiras que recebe uma proposta para filmar um filme artístico e revolucionário. Em meio à crise econômica do país e o alto valor do salário, ele aceita. Após assinar o contrato, Miles passa por diversas experiências que não são nem um pouco dosadas pelo filme.
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Desde o inicio de “A Serbian Film” é estabelecido uma tensão no ar. São mostrados protestos violentos na televisão, expondo assim um ambiente de selvageria, em conjunto com o medo do protagonista de ficar sem dinheiro e perder sua casa. Em contraste com esses elementos, temos uma pequena trama do seu filho descobrindo a sexualidade, este entrando na puberdade e, inocentemente ou não, assistindo aos filmes do seu pai e fazendo perguntas sobre uma certa “coceira”.
Em minha experiência, esses minutos iniciais do longa já demonstram a sua particularidade: juntar o que é grotesco com a inocência. Existe claro um subtexto que justifica todas as cenas apresentadas nele e o filme quebra muitos tabus de maneira bruta, causando um efeito atordoante em quem assiste.
É muito mais fácil apontar o dedo e condenar as cenas de “A Serbian Film”, mesmo para quem já está acostumado a fazer uma leitura cultural das obras, já que a sutileza passa longe. O diretor já disse em inúmeras ocasiões que seu filme é uma alegoria política e que a metáfora do ator pornô é a de qualquer trabalhador sendo explorado e que os nossos problemas do dia-a-dia são tratados como pornografia.
Na época com 35 anos, Spasojevic já tinha passado por muitas dificuldades devido as guerras enfrentadas pela Sérvia. Fora invasão nazista e a guerra com a Áustria, na época em que a Sérvia era uma das republicas que compunha a Iugoslávia, entrou em guerra com a Bósnia, Croácia e nesse período a OTAN explodia misseis no país. Enfim, Spasojevic sentiu que na época o público precisava passar por uma violência insuportável para pode absorver o filme, já que ele é um “diagnostico da sociedade sérvia”.
É importante aqui ressaltar as experiências do diretor para entender suas motivações. Não que a leitura ou gosto do filme de quem assiste precisa estar atrelada a suas intenções, mas saber do que o levou a fazer o filme dá outra perspectiva.
Por baixo de tanto gore e, das intenções políticas e culturais, sobram ainda a trágica história de um pai, ou de uma mãe, que se submete a situações desconfortáveis em prol de sua família. Ou então o poder da influência de um líder que promete benefícios, mas só se importa com a sua visão. Quem sabe ainda a mídia, sem escrúpulos, que explora a miséria humana.
Depois de tantos anos ainda é possível descobrir o que tem por trás de tantas camadas, mas como o filme não faz questão de ser sutil. A fama de ser um filme extremo escondeu os diversos significados que ele pode, ou não, ter. A importância de “A Serbian Film” é a de uma obra que chega onde nenhuma se atreveu a ir, e que consegue expor todos os problemas de uma sociedade fragilizada da forma mais cruel possível.
Eu sempre acho que assistir um filme vale a pena, mas o caminho pode ser tortuoso. Eu garanto que “A Serbian Film” vai te apresentar um trabalho de maquiagem excepcional um roteiro intrigante com uma reviravolta chocante no final. Você pode absorver as mensagens e ter a interpretação que for, mas saiba que “A Serbian Film” não é entretenimento. O filme se propõe a mostrar o pior do ser humano, mas antes disso, ele vai dilacerar a sua alma.
