Seu filho é psicopata? Psicóloga explica os sinais e o que fazer

No dia 14 de outubro de 2023, um vídeo viralizou na internet quando um casal precisou pular da janela do quarto andar de um prédio em chamas em Patos de Minas, no Triângulo Mineiro. O fogo começou em seu próprio apartamento, mas não conseguiram escapar pela porta de entrada devido as chamas.

Como se a cena já não fosse impressionante por si só, o que mais chocou a internet foi a revelação de que incêndio foi causado pela neta do casal. De acordo com informações registradas no boletim de ocorrência, a criança de 11 anos admitiu ter ateado fogo ao sofá, trancado a porta do apartamento e descido para brincar. O avô falou que havia proibido ela de usar o smartphone, mas não foi informado se este foi o motivo para que a criança fizesse isso.

Comentários a respeito do caso circularam nas redes sociais. Um dos mais comuns dizia que a menina era uma psicopata e “projeto de bandida”. Outro tipo de mensagem bastante recorrente era com relação a suposta metodologia de correção que deveria ser empregada na criança: horas de surra, restrição a todas as fontes de entretenimento, estudos intensos e faxinas pela residência eram as sugestões mais comuns – não raro se via comentários sugerindo tudo isso ao mesmo tempo.

Atualmente, a literatura que trata a respeito de pessoas com transtorno de personalidade antissocial (nome técnico usado para designar psicopatia), principalmente quando estas viram assassinos em série, é vasta. A primeira definição do conceito foi descrita em 1941 pelo psiquiatra norte-americano Hervey M. Cleckley no livro “A Máscara da Sanidade”. O termo “psicopata” diz respeito a pessoas com uma personalidade egocêntrica, pomposa, que sentem pouca ou nenhuma compaixão e apresenta comportamentos antissociais e amorais.

É importante entender que o conceito de psicopatia ocorre dentro de um espectro. Ou seja: existem diversas nuances na personalidade de um indivíduo e varia de caso para caso. Assim, a maioria dos psicopatas vivem em sociedade normalmente, mas podem apresentar diversos problemas de convivência. Além disso, os estudos clínicos costumam ser feitos principalmente dentro das prisões, com psicopatas em um nível extremo da condição e que não costumam ser tão comuns. Um dos primeiros a sistematizar os estudos desta natureza foi o psicólogo norte-americano John Douglas, que também atuou no FBI como perfilador.

Apesar de existir diversas variações de caso para caso, um dos principais pontos em comum identificado por Douglas foi o fato de que os psicopatas que acabaram se tornando serial killers tiveram uma criação conturbada e sofreram uma série de abusos nos anos de formação. Dessa forma, o mais provável é que a “receita” para formar um assassino em série seja uma junção de fatores internos e externos.

Em conversa com o Cova Aberta, a psicóloga especialista em infância e adolescência Juliana Moura esclareceu que, de acordo com o volume mais recente do Manual de Diagnósticos e Transtornos Mentais (DMS-5), o diagnóstico para casos envolvendo a psicopatia não é concluído até os 18 anos do paciente. Isto acontece porque, antes desta idade, ainda estão sendo formadas as características referentes a personalidade do indivíduo.

– Costumamos falar 18 anos devido ao consenso geral da comunidade de psicologia e psiquiatria, mas existem casos de adolescência mais tardia ou mais precoce. Então costuma variar de caso para caso e precisa de uma avaliação bastante cuidadosa – destaca.

Contudo, ainda de acordo com a psicóloga, existem alguns sinais que podem ser identificados pelos responsáveis. Um dos mais clássicos é quando a criança começa maltratar animais e crianças mais novas, ou então brincar com objetos inflamáveis. Aliás, durante muito tempo se considerou a chamada “Tríade Sombria” da infância de um psicopata, que seria piromania, machucar animais e urinar na cama até uma idade avançada. Apesar de serem indicativos, Juliana chama atenção para o fato de que isto, por si só, não significa que a criança vá ser uma psicopata.

A psicóloga afirma ainda que a construção da personalidade de uma pessoa é bastante influenciada pelo ambiente que ela cresceu. Dessa forma, aspectos econômicos, familiares e sociais também pesam nesta formação. E isto não é uma exceção para os que possuem transtorno de personalidade antissocial. Ela explica que durante a primeira infância, que é até os sete anos de idade, é como se “vários botões fossem instalados e que podem ou não ser ativados mais tarde”.

A profissional reforça o fato de uma criança tomar alguma atitude considerada perturbadora não significa necessariamente que ela é ou vá se tornar uma psicopata. Uma criança pode fazer este tipo de coisa por curiosidade, inocência ou até mesmo para chamar atenção.

– O fato é que uma criança que faz algo assim não está bem de qualquer forma e precisa ser feito um acompanhamento. É algo que precisa de atenção, mesmo que não seja caso de que a criança, eventualmente, vá virar uma psicopata – conclui.

A busca de ajuda psicológica e psiquiátrica deve ser feita caso os responsáveis identifiquem algo de errado com uma criança com comportamento preocupante. Também se deve se observar também cada caso em particular, pois podem existir motivos tanto externos (problemas familiares, caso de abuso, ambiente tóxico) quanto internos (falta de atenção, negligência) que levem uma criança a, por exemplo, colocar fogo no sofá com os avós trancados em um apartamento.

Sinais de alerta e dicas:

  • Fique atento caso a criança comece maltratar animais, irmãos e crianças mais novas e demonstre interesse em colocar fogo em objetos;
  • Observe e avalie o ambiente externo que esta criança está convivendo: é um local tóxico, negligente e abusivo? Isto pode agravar a situação;
  • Procure ajuda para a criança caso esteja demonstrando comportamento preocupante, mas tente auxiliar para melhorar o ambiente que ela está vivendo;
  • Até os 18 anos de idade não é possível concluir que uma pessoa possui transtorno de personalidade antissocial, portanto evite colocar qualquer tipo de rótulo.

Curiosidade:

O caso que aconteceu no Triângulo Mineiro lembra muito a trama do livro “Menina Má” (1954), do escritor norte-americano William March. No romance, a jovem Rhoda Penmark demonstra um comportamento típico de uma criança psicopata e a mãe da criança observa o desenrolar dos acontecimentos enquanto mergulha em uma investigação a respeito do próprio passado. Em uma das cenas mais chocante do livro, a menina coloca fogo no colchão do zelador do prédio (que também desconfia do comportamento de Rhoda) enquanto o homem tirava um cochilo.

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